Andar com a cabeça levantada.
Há notícias no vento e na luz
Informações nas esquinas
Ideias se revelam nos voos das aves
Dois sorrisos de velhotas
Um reflexo na água onde mergulha o caranguejo
O motor de um avião ao longe
Uma bicada de ave perdida na porta da cozinha
Pedras que absorvem água
Pedras que boiam
Vulcões adormecidos
Barcos com gambiarras festivas no escuro
Riscos de chuva à frente da árvore
Lagartixas de rabo cortado que são mais ariscas
Cães que uivam às ambulâncias
Malucos que riem nos caixotes do lixo
é maravilhoso
estar atento.
Estar Atento
começou o inverno ontem em todo o hemisfério norte
adulto só fala merda
ensinamento animal
não te coles a nenhuma aparência
mas sê sensível ao que te rodeia.
Chamaeleo Calyptratus
li este ensinamento nos olhos deste animal mas gostava ainda de acrescentar algumas palavras minhas: a paisagem é tudo. A paisagem nunca é o resto. E então quando dizem "e o resto é paisagem" é que não faz mesmo sentido nenhum.
boa energia
Título do Post: A VIDA
Descobri que ninguém é melhor do que ninguém por aquilo que consegue fazer. Para muitos isto não é novidade, mas para mim, embora já tivesse formulado este pensamento, só há alguns meses é que eu senti que isso é mesmo verdade. Nem o Mozart é melhor do que o Toy.
Sentença esquisita, esta última. Obrigo-me a explicá-la:
Não há tempo para tudo. Não há tempo para sermos pais e trabalhadores e donos de casa e estudar e ainda por cima fazer isso tudo bem feito. E se por acaso houver tempo para isso não haverá tempo para mais nada. E ser melhor não é deixar de relaxar, de descansar, de ter momentos de lazer.
Na vida de adultos o que faz de nós o que somos é aquilo em que gastamos o nosso tempo. Já que em crianças gastávamos o tempo todo a viver (fazer coisas sem nome, acções sem verbo: era tudo brincar e brincar é viver). Em adultos, tudo o que fazemos tem nome: trabalhamos, estudamos, passeamos, limpamos, descansamos, divertimo-nos, lemos... etc). O que faz de nós o que somos são estes verbozinhos. Se não fazemos muitos verbozinhos somos preguiçosos, se fizermos muitos, somos activos, se só trabalharmos e lermos jornais, somos sérios, se só nos divertimos e passeamos somos vadios, etc.
Há duas coisas que nos impelem para estes verbozinhos: o gosto e a obrigação. O gosto não preciso de explicá-lo e a obrigação pode ter várias origens, mas normalmente são de sobrevivência: pão, saúde/higiene e aceitação social. Julgo que os que podem gastar mais tempo naquilo que gostam são mais talentosos nisso do que os outros. E á tão válido ser talentoso na música como noutra coisa qualquer*. Mas como é que se pode achar que alguém é mais talentoso do que outro alguém se por acaso este segundo não tem hipóteses de ter tempo para aquilo de que gosta e o primeiro tem dinheiro para pagar a alguém que faça por si aquilo que ele não gosta, e assim ter tempo para fazer o que gosta? Não é o tempo que é dinheiro, é o dinheiro que é tempo.
* Vamos agora ao asterisco, porque eu ostensivamente ignorei aqui todas as pessoas que gostam de gastar o tempo em prejudicar outras pessoas. Também ignorei que há pessoas que fazem coisas para os outros, e por isso são mais amadas, claro. Só que serem mais amadas não quer dizer que tenham mais valor.
O Mozart gostava de música. Ele brincava na música, a música era tudo para ele - vivia e sobrevivia dela. O Toy também gosta de música, não duvido, mas gosta mais de outras coisas, e isso vê-se logo. É claro que eu prefiro a música do Mozart, que é uma música que foi feita com toda a alma. O talento é a entrega e cada ser humano se entrega àquilo que escolhe.
Para fazer bem as suas escolhas é preciso, acima de tudo, estar atento a si próprio. E ao lugar que os outros têm dentro de si próprio.
sobre fazer cinema
Não quero para aqui dar lições sobre fazer cinema, porque em primeiro lugar não o sei e em segundo lugar se o soubesse não sabia como o ensinar e em terceiro lugar mesmo que até isso conseguisse o mais provável é que ninguém aprendesse. Não por algum de nós ser burro, mas porque as coisas boas raramente são passíveis de ser ensinadas. Por isso queria só lembrar uma coisa, pois estou certa quem quem se lembrar sempre daquilo que eu vou aqui dizer já se sentirá mais amparado nas suas escolhas...
O cinema é ter numa sala um grupo de pessoas - e ainda que seja só uma - sentadas em cadeiras, na escuridão, com todos os seus sentidos postos no filme. Não, o cinema não é design, que encaminha as atenções das pessoas para coisas mais ou menos úteis, nem fotografia impressa numa revista, nem quadro que se veja em pé numa exposição mal iluminada, nem livro que se leia na diagonal, ou desfolhando rapidamente as páginas entre os dedos. O cinema também não é filme que se veja na televisão, entre uma lata de coca-cola, um xixi e um telefonema. O cinema também não é um DVD que se compre ou se alugue e se tenha problemas com o menu, ou com as colunas, ou com a TV ou com o formato...
O cinema é ter a gente por algum tempo, totalmente entregue ao teu filme.
o Caos e o Cosmos
ontem, durante a minha hora de televisão semanal
tive uma experiência que se inseria perfeitamente no blog - duplas
mas como a quero explicar um bocadinho melhor... cá vai
eram 22h, na rtp.n e na sic.n estavam a "dar-lhe" na enorme crise que acertou mesmo em cheio no nosso "pequeno" planeta
a crise económica, com as bolsas a cairem pelo mundo inteiro (felizmente ainda não houve feridos)
depoimentos de pessoas muito importantes
todos com cara de caso, incluindo os pivots
fartavam-se de mostrar gráficos e indices e percentagens
as imagens que iam entretendo o espectador
cofres de bancos americanos até escritórios de grandes edificios e indices e mais números
eu por ali fiquei
entre um canal e o outro
a entrar no mundo, a tentar perceber o porquê da crise
e quando já estava mesmo cheio de informação
mudei para o odisseia
um rapaz com ar de ser humano, mergulhava ao largo de uma ilha
nadava com as tartarugas, enormes
apanhou uma, trouxe-a para terra no seu barquinho
foi até ao interior da ilha onde a trocou por um porco
Ureparapara in the Banks Islands
fresquinhas do mercado!
duas senhoras encontraram-se há 15 minutos à minha frente no mercado da horta
tinham os seus setenta anos...
uma delas, cabelos brancos bem penteados e baton vermelho diz à outra, mal a vê (mais gordinha, de óculos e caracóis cinzentos):
-esta noite sonhei que estava mais umas do nosso tempo numa festa num género de teatro fayalense. e também estavas lá tu!
-ai sim? todas nos teatros?
-não, tu estavas muito zangada por causa de não sei quê...
não pude ouvir mais...
as velhinhas - vi mais para além destas, por isso sei do que estou a falar - nesta manhã cinzenta estavam todas muito bonitas. as roupas delas têm texturas e padrões que ficam lindamente com estes dias.
coisas que se dizem
cada povo tem as suas expressões, que são influenciadas pelo modo de vida desse povo e que por meu lado também acredito que influenciem o modo de vida das pessoas
aqui na ilha do faial
as pessoas tratam-te por tu
naturalmente sem problemas
adoro isso
quem me dera fazê-lo sem um nozinho na garganta
hei-de conseguir
no continente diz-se "estou um bocadinho cansada"
aqui não
aqui diz-se "estou uma coisinha cansada"
"estou uma coisinha maldisposta", "esse tomate ainda está uma coisinha verde"
não é giro? gosto tanto...
"é forte maluco" - é muito maluco
"ela tem forte vontade" - ela tem muita vontade
"dei forte pancada com este braço" - dei uma grande pancada com este braço
e esta é muito engraçada: quando passeio com o Julião nas ruas da cidade e ele está a dormir algumas pessoas comentam: "tadinho, tá-se consolando!" :) acho que está é uma verdadeira expressão idiomática porque não há propriamente "tradução" é assim: está-se consolando. e está!
Globalização
Eles proibem tudo
Eles proibem tudo
e não deixam nada
Eles obrigam-nos a tudo
Eles obrigam-nos a tudo
e não deixam nada
.
Mais facil será satisfazerem-nos todos os Natais
Quando todos os lugares do mundo forem iguais
Poderemos ficar em casa, finalmente
a consumir descansadamente
Quando se anda sozinho na praia pensa-se
porque é que será que muitas vezes, quando estamos sozinhos, nos sentimos e nos comportamos como se estivéssemos a ser observados por um número considerável -mas apesar de tudo impossível de precisar- de olhos?
Quando se anda de bicicleta pensa-se
que muitos problemas políticos e não só
são consequência da ignorância, ou pelo menos da indiferença pelos seguintes factos
que as massas são o resultado da soma das individualidades
e que em toda a individualidade pesa a força das massas